A pandemia da Covid-19 desafiou o mundo inteiro com novas rotinas para o enfrentamento ao novo coronavírus. Restrições na operação de empresas e na circulação de pessoas forçaram a adoção de medidas para dar continuidade à missão de organizações dos vários setores econômicos e sociais. Com a Igreja não foi diferente. Para além do atendimento pastoral, que teve de se adequar a novas possibilidades, também a gestão dessas entidades precisou ser repensada.
O ecônomo da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), monsenhor Nereudo Freire Henrique, partilhou a experiência da entidade diante do novo cenário apresentado pela pandemia, apontando desafios e aprendizados trazidos no novo contexto mundial.
“A primeira grande pergunta: como enfrentar uma experiência que mexe com a vida? E aí você tem que lidar com a mudança de conceitos, depois a questão da mudança de hábitos, a necessidade de envolver pessoas, mudar comportamentos”, situa monsenhor Nereudo.
A CNBB tem sido provocada pela nova gestão por uma tônica resumida na indicação do arcebispo de Belo Horizonte (MG) e presidente da Conferência, dom Walmor Oliveira de Azevedo: “Temos de ser exemplares em matéria de gestão”, o que inclui não só a questão administrativa, mas em vista da atuação pastoral também.
Desafios
Para o ecônomo da CNBB, o primeiro desafio é “tentar assegurar o que for melhor para a vida, não medir esforços para garantir algo que é essencial, o dom da vida”. Aqui também se encontra a necessidade de equilibrar esforços para a proteção da vida humana e também da vida da instituição.
“Temos como prioridade a vida. A vida dos colaboradores, das pessoas que são beneficiadas pela instituição, contempladas pela instituição, como também a garantia da vida da instituição”, ressalta, recordando o processo de planejamento realizado na entidade já no início de março.
Medidas tomadas na CNBB
Monsenhor Nereudo recordou os passos da equipe gestão do Secretariado Geral da CNBB para enfrentamento da pandemia. Primeiro, foi criado um gabinete de crise, que levantou dados para a construção de um planejamento e as adaptações necessárias. Em seguida, novas ações modificaram a rotina de funcionários e assessores presentes na instituição. O grupo também motivou a participação mais ativa de alguns conselhos, como o Conselho Econômico, para o acompanhamento da nova realidade.
“Foi dada prioridade a um novo orçamento, porque nós tínhamos um orçamento para o exercício 2020, elaborado em 2019, com um cenário de expectativas de receitas, de despesas, de investimentos, de ações, tudo direcionado para assegurar a evangelização. Com a pandemia, tivemos a diminuição de receitas, obviamente teria que ter uma redução de despesas”, conta monsenhor Nereudo.
Elaborado um novo orçamento, o grupo revisou receitas que poderiam ser asseguradas ou o que era duvidoso e também reavaliou as despesas e contratos passíveis de renegociação.
Neste sentido, a CNBB também se adequou para a aplicação da Medidas Provisória 936, que permitiu às empresas redução da jornada de trabalho e no salário de modo a garantir os empregos. Além disso, a entidade também implantou regime de banco de horas para alguns colaboradores, antecipação de férias e o trabalho na modalidade home office.
Mudar mentalidades
Vários paradigmas têm sido quebrados durante a pandemia. Aí que entra o desafio de mudar mentalidades. Monsenhor Nereudo afirma que o mundo será outro e que a pandemia mostrou novas experiências no trabalho, como o home office.
“Algumas áreas tiveram que trabalhar bem mais e ajudar na montagem do novo modelo de operação, como, por exemplo, a área de Tecnologia da Informação, com o suporte fundamental para todas as ações, de forma que a novidade exigiu da direção, dos coordenadores um novo pensar, uma nova metodologia e assim, a cada dia, a cada semana, a gente revisa, e vamos traçando uma nova caminhada de modo que possa assegurar os nossos propósitos, os nossos objetivos”, conta.
Neste cenário, as instituições religiosas, tanto dioceses com suas realidades específicas, as paróquias e a própria CNBB , com sua natureza específica de organismo colegiado dos bispos, tem ainda o desafio de ajudar os fiéis nesta mudança na forma de pensar.
“O papel da Igreja é de mudar a mentalidade das pessoas, mostrando que a vida está em primeiro lugar. Diante da insensatez, o desafio é grande da instituição religiosa de recuperar os valores, a fraternidade, o amor, a solidariedade, recuperar o sentido da vida”, ressalta monsenhor Nereudo.
No tão falado “novo normal” há a expectativa de compreensão, entendimento e mudança de atitude: “Temos que, daqui para frente, construir um mundo solidário, que não haja barreiras de separação, ricos e pobres, chegou o tempo de mudarmos. E o desafio da instituição religiosa é a conscientização das pessoas que vivemos num mundo rico, onde temos tudo, porém falta a partilha, a solidariedade, o ser responsável pelo outro e pela criação. Tempo da pandemia desafiar as instituições religiosas a sensibilizarem as pessoas a serem pessoas humanas”.
Aprendizados
Para quem enfrenta a situação com ações tão novas, são vários os aprendizados. Monsenhor Nereudo explica que a Conferência tem aprendido a buscar uma reflexão que leve à aproximação, mesmo com o distanciamento. “Aproximação no sentido de que é possível usar novas ferramentas, aí vem a tecnologia da informação, ferramentas modernas onde se pode apresentar, participar de reuniões e conferências, cada um do seu lugar, cada um do seu ambiente, mas próximos, usando ferramentas modernas”, explica.
Nesse processo, a instituição terá o desafio de economizar, ser mais precisa, o que já é experimentado na CNBB. A instituição já realizou reuniões do Conselho Episcopal Pastoral e do Conselho Permanente de forma virtual, mas ciente de que haverá um modelo híbrido, com reuniões presenciais e por videoconferência. “Foi possível realizar reflexões sérias economizando tempo e recursos”, garantiu monsenhor Nereudo.
Família e planeta
Nesse novo modo, há a esperança de que os colaboradores serão “levados” a um ambiente familiar. “Ali, com o acompanhamento da instituição, quem sabe teremos a recuperação da nossa humanidade?”.
Com parte dos colaboradores trabalhando em suas casas, “também estaremos recuperando o planeta”, frisou o ecônomo. “Antes estávamos na loucura do mundo, realizando eventos. Agora, vamos produzir mais, com muita eficiência e estaremos, quem sabe, economizando muitos recursos naturais, preservando a vida, o planeta e queremos deixar para trás o desejo do consumo”.
Mais humanos
“Superando a pandeia, seremos mais próximos, mais solidários, mais responsáveis e mais humanos. A CNBB será ainda mais um ambiente humano. Já fazia a experiência anterior, agora com certeza estaremos dando um passo para que a vontade de Deus se concretize. Um mundo fraterno, solidário e justo, é o Reino de Deus”.